Cineluta: filmes para um outro mundo possível

O Sindicato ASSUFOP lança uma coluna semanal com indicações de produções audiovisuais que conquistaram corações e mentes ao retratarem – de forma ficcional ou não ficcional – pessoas, histórias e períodos ligados aos direitos humanos, às relações de trabalho, à ecologia, às opressões, à diversidade e à política.

O intuito é ofertar aos leitores, neste período de pandemia, um leque de filmes que destacam a luta social em prol dos direitos e nos ajudam, de certa forma, a entender e refletir sobre a necessidade de construirmos, de infinitas formas, um outro mundo possível. Mundo, esse, onde seja possível viver sem opressões, um lugar mais igualitário socialmente, mais aberto à diversidade, menos violento, competitivo e repressor.

A aposta é que os filmes, por agregarem diferentes artes – como a música, o teatro, a dança, a literatura -, são um importante dispositivo que sensibiliza o ser humano e apresentam diferentes formas de pensar e de sentir a vida


Cineluta | Filme “No” mostra os bastidores da luta contra a ditadura chilena de Pinochet

Amanhã (11/09), fará 47 anos da morte de Salvador Allende. Em 11 de setembro de 1973, aviões militares do próprio Chile sobrevoaram o palácio presidencial do país e bombardearam o local, que culminou na morte de Allende, presidente filiado ao Partido Socialista chileno e democraticamente eleito. A partir dessa data, o general Augusto Pinochet sequestrou o poder maior do país e, junto às Forças Armadas, impôs uma ditadura sombria que durou cerca de 17 anos de brutal repressão e perseguição aos seus opositores.

O diretor chileno Miguel Littín fez, em 2014, um filme que retrata com detalhes as últimas horas de Salvador Allende, que resistiu bravamente até o fim contra o golpe de Estado no Chile. O longa se chama “A última manhã de Salvador Allende” e está disponível na plataforma de streaming Netflix.

Mas, o filme em destaque desta quinta-feira (10/09) no Cineluta é outro. Trata-se do longa “No” (2012), do diretor, também chileno, Pablo Larraín. A produção se passa no ano de 1988, no Chile, quando o ditador Augusto Pinochet é forçado, por conta da pressão internacional, a convocar um referendo para saber se deveria continuar ou não no cargo.

O país votaria SIM ou NÃO em Pinochet, o que poderia estender seu governo ditatorial por mais oito anos. Os líderes da oposição convencem René Saavedra (interpretado por Gael García Bernal), um jovem e impetuoso executivo de publicidade, a liderar a campanha pelo “NO”. Contra todas as probabilidades, com escassos recursos e sob escrutínio dos servos do déspota, Saavedra e sua equipe criam um plano audacioso para vencer o plebiscito e libertar o Chile. O longa foi indicado ao Óscar de 2013 na categoria Melhor Filme Estrangeiro.

A produção está disponível no YouTube para comprar ou alugar. Atualmente, setembro de 2020, os preços do filme no YouTube são: R$ 19,90 (qualidade HD) e R$ 12,90 (qualidade SD) para comprar e R$ 3,90 (qualidade HD) para alugar. É bom lembrar que comprar ou alugar um filme no YouTube é simples e o espectador assiste no próprio site. Confira o trailer abaixo:

Título “No” (Original)
Ano de produção 2012
Dirigido por Pablo Larraín
Estreia
18 de maio de 2012 (Mundial)
Outras datas 
Duração 118 minutos
Classificação  12 – Não recomendado para menores de 12 anos
Gênero
Países de origem

*Com informações do site do MST


Cineluta: “Eu, Daniel Blake” retrata os impactos da precarização dos serviços públicos na vida do trabalhador

O Cineluta traz nesta semana a indicação de um filme britânico que ilustra uma das faces do atual Capitalismo neoliberal e suas consequências para os trabalhadores. O longa “Eu, Daniel Blake” traz a história de um trabalhador (Daniel Blake), marceneiro, que, devido às suas complicações cardíacas, se vê obrigado a afastar-se do trabalho. O protagonista tem 59 anos, mora em Newcastle e faz parte da faixa dos trabalhadores que não têm tempo de serviço suficiente para se aposentarem e também não têm idade para se recolocarem no mercado de trabalho.

Após ter sido rejeitado por empresas por conta do seu estado de saúde, Daniel recorre ao Estado para ter acesso aos seus direitos enquanto trabalhador, como o auxílio saúde e os provimentos por afastamento por doença. Porém, Daniel, cuja esposa havia falecido recentemente, enfrenta uma grande burocracia do Departamento de Serviço Social inglês – o equivalente da Previdência Social brasileira – para comprovar sua frágil situação, que exige dele domínio da informática e fluência no acesso à internet. Diante disso, seus diretos são frequentemente negados, enquanto sua renda diminui consideravelmente.

No desenrolar da trama, Daniel conhece a jovem Katie no Departamento de Serviço Social inglês. Katie é solteira, está desempregada e havia acabado de chegar na cidade com seus dois filhos pequenos. Daniel Blake se comove com a situação da jovem e, para ajudá-la a procurar emprego, ele cuida das crianças e faz reformas em seu apartamento. A proximidade entre os dois diante da dificuldade financeira cria uma bonita amizade e uma relação de cumplicidade, mesmo faltando o básico para a sobrevivência de ambos, como alimentos, material de higiene e roupas.

Ao esmiuçar a vida de um trabalhador de meia idade na Inglaterra e ao denunciar as falhas do Serviço Social inglês, o diretor Ken Loach joga luz nas vidas dos trabalhadores comuns e retrata, com detalhes, a precarização da força de trabalho nos tempos atuais; a diluição dos serviços públicos; o desmonte de direitos no mundo do trabalho; o alinhamento do Estado às políticas de arrocho orçamentário; a dificuldade de comunicação entre diferentes gerações diante de um mundo cada vez mais automatizado, sem rosto; e a crescente desigualdade social que se acirra em diferentes esferas sociais, aumentando a pobreza e concentrando renda nas mãos de muitos poucos.

 

Ficha técnica:

Título “I, Daniel Blake” (Original)
Ano de produção 2016
Dirigido por Ken Loach
Estreia
5 de Janeiro de 2017 (Brasil)
Outras datas 
Duração 97 minutos
Gênero
Países de origem Bélgica, França e Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte

O filme completo está disponível no youtube no seguinte link: https://www.youtube.com/watch?v=129PJIj-q6E


 

Documentário “A 13ª Emenda” conecta a escravidão com a brutalidade do racismo nos EUA

O documentário “A 13ª Emenda”, lançado em 2016, retrata a opressão brutal contra os negros nos Estados Unidos através de entrevistas, imagens de arquivo e reportagens. A narrativa atravessa diferentes períodos históricos do país e escancara similaridades da violência racial entre a “América” escravagista e a “América” de hoje.

Com imagens impactantes e cenas reais, o filme documentário traz falas de juristas, políticos, artistas, ativistas, militantes negros e também de vítimas da segregação racial norte-americana que dão o tom de denúncia ao genocídio contra os negros. Os enunciados são amparados por dados científicos, relatos de tortura e informações de censos sociais dos EUA.

O longa desenha a espinha dorsal da construção histórica do preconceito racial no país, trazendo o presídio como pano de fundo de uma população empurrada para a marginalização, destituída de seus direitos básicos e aprisionada pelo encarceramento em massa. Tudo isso com o chancelamento das Instituições norte-americanas. A produção ilustra bem como os negros saíram do processo desumano da escravidão e foram realocados para o trabalho precarizado, rebaixado e mal remunerado.

O nome da produção faz alusão à 13ª Emenda da Constituição dos Estados Unidos, que aboliu, oficialmente, a escravatura no território dos EUA e determina que ninguém pode ser submetido à escravidão ou ao trabalho forçado, salvo como punição de um crime.

A obra reforça que, mesmo após 151 anos da promulgação da Emenda, a tensão racial continua emergente no território estadunidense, com atualização das formas de opressão, com novos grupos da supremacia branca, com a brutal violência policial, com um certo aval do Estado, e, muitas vezes, com a negligência da Justiça.

O documentário está disponível na Netflix. Confira o trailer abaixo.

Ficha técnica:

Título  The 13th (Original)
Ano de produção 2016
Dirigido por Ava DuVernay
Estreia
7 de Outubro de 2016 ( Mundial )
Outras datas 
Duração 100 minutos
Classificação 16 – Não recomendado para menores de 16 anos
Gênero
Países de Origem


“Eles não usam black-tie”, um clássico desconfortavelmente atual.

O Cineluta revive um clássico da filmografia brasileira baseado na premiada peça teatral do diretor italiano Gianfrancesco Guarnieri. Eles não usam black-tie, de 1981, marcou a produção cinematográfica nacional ao retratar a mobilização dos trabalhadores por direitos através das greves, enfatizando a luta de classes, a exploração da força de trabalho, sem negligenciar os conflitos individuais e as contradições morais do movimento paredista. A produção foi premiada em diversos festivais internacionais e recebeu o Grande Prêmio do Júri no Festival de Veneza.

Em linhas gerais, Eles não usam black-tie se passa numa comunidade operária. O filme conta a história de uma família de trabalhadores de uma fábrica que enfrenta a desvalorização dos salários, a precarização da mão de obra e a ameaça constante de demissão por parte dos patrões.

O enredo joga luz no conflito entre o respeitado pai sindicalista, Otávio, e o filho recém contratado, Tião, cuja namorada, Maria, que também trabalha na indústria, está grávida. Diante da piora das condições do trabalho e do rebaixamento salarial da categoria, Otávio retorna às mobilizações sindicais, planejando com seus companheiros uma nova paralisação para forçar a negociação com os patrões. Do outro lado, o filho, que deseja se casar com Maria. Desacreditado do movimento grevista e com receio de perder o emprego, Tião resiste à convocação sindical e questiona o pensamento político do pai.

Eles não usam black-tie utiliza desse conflito moral familiar como pano de fundo para debater questões sociais complexas lidas na face cruel da desigualdade brasileira, na luta por sobrevivência de um povo sem direitos, nas dificuldades e nos antagonismos de uma greve e no papel da polícia frente ao choque de classes.

O tom dramático das cenas exalta a frágil condição humana, bastante explorada no filme por meio dos personagens que são confrontados por escolhas como a coragem ou a prudência; o desemprego ou a exploração; a utopia ou o consentimento; a rebelião ou a disciplina; o sensível ou o cru; a coletividade ou a individualidade. A genialidade da narrativa pode ser lida nos elementos fílmicos usados pelo diretor, Leon Hirszman, para representar o proletariado e sua angústia, como os movimentos de câmera, efeitos de iluminação, figurino uniforme e a paleta de cor voltada para a tonalidade sépia e monocromática, conversando com os elementos pertencentes a uma fábrica.

Sem dúvida, Eles não usam black-tie é um filme atemporal e, portanto, um clássico. Isto é, uma produção audiovisual que mesmo após 39 anos do seu lançamento, se mantém atual ao problematizar dilemas inerentes ao ser humano, à subjetividade e às relações sociais, sem ignorar o contexto histórico sobre o qual a trama se desenvolve. Assista ao filme abaixo.

Ficha técnica

Data de lançamento: 28 de setembro de 1981 (Brasil)
Direção: Leon Hirszman
Autor: Gianfrancesco Guarnieri
Música composta por: Gianfrancesco Guarnieri, Adoniran Barbosa, Chico Buarque, Radamés Gnattali
Roteiro: Leon Hirszman, Gianfrancesco Guarnieri

Para abrir a coluna, segue abaixo a indicação do filme “Indústria Americana”, ganhador do Óscar 2019 na categoria de melhor documentário.

Indústria Americana, uma produção para entender a precarização atual do trabalho

 

Em meio às tensões diplomáticas envolvendo Estados Unidos e China, o filme documentário Indústria Americana é um bom pedido para exemplificar o conflito dos dois países na produção econômica, e a precarização absoluta do trabalho no capitalismo atual.

O filme de Julia Reichert e Steven Bognar mostra a chegada dos chineses em uma fábrica de vidro para automóveis nos EUA, após o fechamento de uma indústria americana do mesmo setor.  A multinacional chinesa Fuyao impõe outras regras de trabalho, outra postura laboral, e condições outras de trabalho precário. O filme ganhador do Óscar em 2019 na categoria melhor documentário, registra o convívio dos trabalhadores chineses e estadunidenses que dividem o mesmo lugar de trabalho, lidando com suas diferenças.

Com o passar dos dias na nova rotina de trabalho, os chineses que se acostumaram com longas horas de trabalho e apenas duas folgas ao mês, rotulam os americanos de “preguiçosos” e os culpam por atrasos na produção. A empresa chinesa passa a contratar os antigos trabalhadores da empresa americana falida, porém com salários 3 vezes menores, jornadas mais longas e em postos mais precários.

O filme também retrata a dor e a melancolia dos trabalhadores diante da exploração cada vez maior por parte da fábrica, e a necessidade da criação de um sindicato para lutar pelos direitos trabalhistas. Vale ressaltar que a legislação dos Estados Unidos prejudica as formações de sindicatos, uma vez que a negociação individual entre empregado e patrão sobrepõe a negociação coletiva, além de não proteger a luta e a existências dessas entidades. Mesmo assim, os trabalhadores decidem se organizar para formar um sindicato na fábrica chinesa e enfrentam assédios, perseguições e demissões para não conseguirem se organizar.

Trata-se de uma produção indispensável para quem deseja conhecer como os meios de produção se modificaram nos últimos anos para atender o capitalismo global ultra-acelerado do século XXI, e como o trabalhador enfrenta o desafio de lidar com diferentes culturas sendo ainda mais explorado, mais oprimido e ainda mais impedido de lutar pelos seus direitos básicos.

 

Onde assistir?

Indústria Americana” está disponível na Netflix. A plataforma de streaming também disponibiliza aos seus assinantes a gravação de uma conversa entre os diretores Julia Reichart e Steve Bognar com Barack e Michelle Obama.

Ficha técnica:
Data de lançamento: 25 de janeiro de 2019 (mundial)
Direção: Julia Reichert, Steven Bognar
Prêmios: Oscar de Melhor Documentário de Longa-Metragem, MAIS
Indicações: Prêmio BAFTA de Cinema: Melhor Documentário, MAIS
Produção: Julia Reichert, Steven Bognar, Jeff Reichert, Julie Parker Benello
Produtoras: Higher Ground Productions, Participant