PEC Emergencial é aprovada com graves ataques aos servidores públicos

A matéria estava parada no Congresso desde 2019, mas em apenas uma semana foi votada e passou no Senado e depois na Câmara, após o governo federal aceitar a concessão de um novo auxílio emergencial em troca do congelamento salarial dos servidores públicos e outros ataques.

Crédito: Pedro França/Agência Senado

A Câmara Federal concluiu, na madrugada dessa sexta-feira (12), a votação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 186 – conhecida como PEC emergencial. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM/MG), marcou a promulgação da PEC para esta segunda-feira (15).

A PEC 186/19, que estava em tramitação desde 2019 como parte da proposta de reforma administrativa do governo Bolsonaro, foi aprovada em dois turnos, nas duas Casas, em apenas uma semana, depois que foi incluído no texto o auxílio emergencial à população afetada pela pandemia. A liberação da ajuda financeira foi vinculada à aprovação dos ajustes fiscais e retirada de direitos dos servidores públicos, o que fez muitos parlamentares se referirem ao texto como PEC da chantagem.

A oposição apresentou vários argumentos e destaques para desvincular a aprovação do auxílio emergencial, necessária e urgente, dos ataques e ajustes fiscais exigidos como contrapartida pelo governo. No entanto, todas as tentativas de retirar do texto as medidas de desmonte foram derrotadas.

O programa de auxílio emergencial para 2021, com limite de R$ 44 bilhões, será financiado com créditos extraordinários, que não são limitados pela Emenda Constitucional 95. Logo, as despesas com o programa não serão contabilizadas para a meta de resultado fiscal primário e também não serão afetadas pela chamada regra de ouro — mecanismo que proíbe o governo de fazer dívidas para pagar despesas correntes, de custeio da máquina pública.

No início da semana, o governo anunciou que o auxílio deverá ser de R$ 175,00 a R$ 375,00 por quatro meses (março a junho). Para a família monoparental dirigida por mulher, o valor será de R$ 375,00 ; para um casal, R$ 250,00 ; e para o homem sozinho, de R$ 175,00.

Congelamento salarial dos servidores públicos por 15 anos

Embora tenha sido retirado o impedimento de progressões e promoções funcionais, o texto aprovado prevê gatilhos que congelam salários, abonos e outros direitos e benefícios dos servidores públicos, investimentos e concursos públicos, entre outros, até 2036.

Confira aqui como votaram os deputados mineiros

Na esfera federal, todas as vezes em que a relação entre as despesas obrigatórias sujeitas ao teto de gastos (Emenda Constitucional 95) e as despesas totais superar 95%, os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e o Ministério Público deverão vedar reajuste de salário para o funcionalismo, realização de concursos públicos, criação de despesas obrigatórias e lançamento de linhas de financiamento ou renegociação de dívidas. Segundo a assessoria da Câmara dos Deputados, o Poder Executivo é o que está mais próximo desse índice, com 92,4%, e a estimativa é que chegue a 95% em 2024.

Os estados e municípios estão sujeitos à mesma regra dos 95%, porém apenas de forma facultativa. No caso desses entes da Federação, também será possível acionar as medidas de contenção de gastos quando a relação entre despesas correntes e receitas correntes atingir 95%. Nesse caso, a implementação dependerá apenas de atos do Executivo, com vigência imediata. Das 27 unidades da Federação, 3 já ultrapassaram o limite de 95%: Rio Grande do Sul (98,27%), Minas Gerais (96,9%) e Rio Grande do Norte (95,7%).

Quanto à contratação de pessoal, novas exceções serão acrescentadas ao texto constitucional, permitindo a admissão temporária de pessoal e a reposição de temporários para prestação de serviço militar e de alunos de órgãos de formação de militares.

Fundos públicos

Um destaque retirou do texto toda a parte que proibia a vinculação de qualquer receita pública a fundos específicos. Com isso, a Constituição Federal continua com a redação atual no dispositivo que proíbe apenas a vinculação de impostos aos fundos, com algumas exceções. A criação de novos fundos será proibida se seus gastos puderem ser alcançados por meio da vinculação de receitas orçamentárias.

Entretanto, outro artigo relacionado ao tema continuou no texto aprovado, permitindo ao Executivo Federal usar, até o fim de 2023, o superávit financeiro dos seus fundos públicos para pagar a dívida pública. A medida vale inclusive para estados e municípios, mas se o ente federado não tiver dívida pública para amortizar, o dinheiro será de livre aplicação.

Ficam de fora os fundos públicos de fomento e desenvolvimento regionais e, como o trecho da Constituição sobre vinculação não foi mudado, também não podem ser usados o Fundeb e os fundos de atividades da administração tributária.

Segundo informação divulgada pela Agência Reuters, apurada com representantes do governo, a avaliação é que o superávit dos fundos deve se aproximar de R$ 100 bilhões este ano. Para 2022 e 2023, o volume será bem menor já que o grosso do estoque já teria sido repassado.

Calamidade pública

A partir da promulgação da PEC Emergencial, a Constituição passará a contar com um regime orçamentário excepcional para situações de calamidade pública — como é o caso da pandemia. Segundo o texto, durante a vigência do estado de calamidade, a União deve adotar regras extraordinárias de política fiscal e financeira e de contratações para atender às necessidades do país, mas somente quando a urgência for incompatível com o regime regular.

As proposições legislativas e os atos do Executivo com propósito exclusivo de enfrentar a calamidade e suas consequências sociais e econômicas ficam dispensados de observar várias limitações legais, desde que não impliquem despesa obrigatória de caráter continuado. Entre as regras que ficam suspensas está a proibição de concessão ou ampliação de benefício tributário que gere renúncia de receita. Também estão suspensos os limites e condições para contratação de operações de crédito. O regime extraordinário também permitirá a adoção de contratação simplificada de pessoal, em caráter temporário e emergencial, e de obras, serviços e compras.

O superávit financeiro apurado em 31 de dezembro do ano anterior poderá ser destinado à cobertura de despesas com medidas de combate à calamidade pública, além do pagamento da dívida pública. Durante a vigência da calamidade pública, ficará também suspensa a proibição de que pessoas jurídicas em débito com o sistema de seguridade social assinem contratos com o poder público.

A PEC prevê, ainda, que uma lei complementar poderá definir outras suspensões, dispensas e afastamentos aplicáveis durante a vigência da calamidade pública. A decretação do estado de calamidade pública, que vai disparar o regime extraordinário, passa a ser uma atribuição exclusiva do Congresso Nacional, a partir de proposta do Executivo.

Desvinculação de receitas

A PEC também muda regras para vinculação de receitas, liberando fatias do Orçamento que hoje são destinadas exclusivamente a certas áreas. Atualmente, a Constituição proíbe a vinculação de receitas tributárias, com algumas exceções. A proposta mexe nessa estrutura, estendendo a proibição para todos os tipos de receita e expandindo as exceções, por exemplo, para a vinculação de receitas para serviços de administração tributária — que passa a ser proibida.

Outros pontos da PEC

– Inclui os gastos com pessoal inativo e pensionistas no teto de despesa dos Legislativos municipais. Atualmente, esse teto inclui os subsídios dos vereadores, mas exclui gastos com inativos. A despesa não pode ultrapassar o somatório da receita tributária e das transferências constitucionais.

– Inclui os pensionistas entre as despesas com pessoal que não podem exceder os limites estabelecidos em lei complementar. Atualmente, a Constituição prevê apenas que a despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos estados, do DF e dos municípios não pode ultrapassar esse limite, sem mencionar os pensionistas.

– Inclui no artigo constitucional que trata da administração pública a determinação de que órgãos e entidades façam, individual ou conjuntamente, uma avaliação das políticas públicas e divulguem os resultados.

– Veda a transferência a fundos de recursos oriundos dos repasses feitos aos Poderes Legislativo e Judiciário, ao Ministério Público e à Defensoria Pública, os chamados repasses duodecimais. Se houver sobra de recursos, ela deve ser restituída ao caixa único do Tesouro do ente federativo ou será deduzida das próximas parcelas de repasse.

– Inclui na lei a previsão de uma lei complementar para regulamentar a sustentabilidade da dívida pública. Essa lei deverá especificar indicadores de apuração; níveis de compatibilidade dos resultados fiscais com a trajetória da dívida; trajetória de convergência do montante da dívida com os limites definidos em legislação; medidas de ajuste, suspensões e vedações; e planejamento de alienação de ativos com vistas à redução do montante da dívida. A lei poderá autorizar ações de ajuste fiscal em caso de crise nas contas públicas. União, estados, Distrito Federal e municípios também deverão conduzir suas políticas fiscais de forma a manter a dívida pública em níveis que assegurem sua sustentabilidade, conforme a ser estabelecido pela lei complementar.

– Modifica o texto constitucional que trata da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para determinar que cabe a LDO estabelecer as diretrizes de política fiscal e respectivas metas, em consonância com trajetória sustentável da dívida pública. Inclui um parágrafo para determinar que as leis de que trata o artigo 165 da Constituição (Plano Plurinual, LDO e Lei Orçamentária Anual) devem observar os resultados do monitoramento e da avaliação das políticas públicas.

– Estende de 2024 para 2029 o prazo para que estados e municípios paguem seus precatórios.

Tramitação

Houve acordo no Senado e na Câmara para que o rito de votação e tramitação da PEC fosse acelerado, o que permitiu que fosse votada em dois dias pelos senadores e em três dias pelos deputados.

Após análise, a consultoria do Congresso Nacional recomendou a promulgação da PEC sem necessidade de retorno ao Senado, uma vez que o texto sofreu apenas supressão e não inclusão de novos itens.

* Com informações do ANDES-DN, das Agências Câmara, Senado e Reuters.

 

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